o novo filme de francis ford coppola, "megalopolis", é uma obra ambiciosa, rica em complexidade visual e temática, mas que acaba por tropeçar na tentativa de entregar uma narrativa coesa e inovadora. embora explore grandes ideias sobre civilização, decadência e inovação, a sua execução fica presa em clichés e resoluções demasiado simplistas.
"megalopolis" faz lembrar filmes como "dark city", de 1998, com a sua estética distópica e paralelismos temáticos, mas falta-lhe a frescura que se esperaria de um cineasta visionário. o filme apresenta-se como uma fábula, estabelecendo comparações entre a américa contemporânea e a roma antiga, retratando um império em ruínas, marcado pela corrupção, líderes não eleitos, influenciadores, decadência social e luxo excessivo. esta crítica aos poderosos surge, no entanto, envolvida na mesma ostentação que critica, num reflexo da decadência que coppola parece querer abordar. a primeira metade do filme é cativante, mas a segunda sucumbe a arcos narrativos previsíveis e a uma divisão simplista entre o bem e o mal, o que empobrece a complexidade da experiência humana, que raramente se limita a preto e branco.
apesar disso, "megalopolis" brilha em algumas das suas ideias mais abstratas. destaca-se a mensagem de que o verdadeiro progresso exige quebrar barreiras e preconceitos, aceitando a individualidade como uma força motriz; se nos limitarmos a resolver problemas sem propor alternativas, ficamos estagnados. a noção de tempo como um superpoder, não no sentido de controlo, mas de aproveitar cada momento com consciência, é também interessante, tal como a metáfora de perdermos esse poder em momentos de depressão ou exaustão. este é um ponto que ressoa, pois todos temos momentos em que sentimos perder a capacidade de ver o mundo e valorizar o tempo. o filme aborda ainda a ideia de que a civilização pode ser responsável pela sua própria destruição, um tema já explorado noutras obras, mas que serve como uma boa base narrativa aqui.
os atores, liderados por adam driver, giancarlo esposito e nathalie emmanuel, cumprem perfeitamente a visão do realizador. nenhum se destaca em particular, e isso é algo positivo, pois permite que o conjunto brilhe como um todo. visualmente, "megalopolis" é uma experiência impressionante. a cinematografia utiliza contrastes de luz e sombra para ilustrar os futuros possíveis apresentados no filme: um quente e luminoso, outro frio e escuro. este contraste reflete-se nos ambientes e também na caracterização das personagens. os cenários distópicos, que misturam elementos do passado, presente e futuro, fazem lembrar jogos como bioshock infinite, com detalhes memoráveis, como andaimes que parecem flutuar sobre a cidade. a banda sonora combina temas clássicos inspirados em óperas e histórias de impérios com influências noir, criando uma atmosfera rica e envolvente. a montagem do filme é, provavelmente, um dos seus pontos mais fortes; a repetição de imagens em diferentes sequências permite interpretações variadas, o que demonstra um trabalho minucioso da equipa de edição e criatividade visual.
no entanto, apesar da sua excelência técnica e das ideias que apresenta, "megalopolis" perde-se numa resolução demasiado simplista, que não reflete a realidade do mundo, particularmente fora do espectro político americano, onde a divisão entre bem e mal é mais acentuada. em última instância, este é também um filme sobre musas e sobre como o amor impulsiona grandes ideias, mas aborda este tema de uma perspetiva antiquada, onde as mulheres são vistas mais como apoio do que como parceiras iguais.
no geral, "megalopolis" é um bom filme, mas que não alcança totalmente as suas ambições. ainda assim, recomendo vê-lo no grande ecrã, onde os seus elementos visuais e sonoros podem ser plenamente apreciados.
nota: 7/10
é um filme que vale a pena ver para refletir e discutir, mesmo que falhe em alguns aspetos. afinal, tudo o que acabei de dizer é apenas o meu ponto de vista — e isso não passa disso, a vista de um único ponto.
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